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  • Espaço Cultural BXD IN CENA completa 1 ano no dia 13 de maio e reafirma: a arte da baixada resiste, emociona e transforma.

    foto: @ lauanegarcez Há um ano, o que era só um sonho virou endereço. O Espaço Cultural BXD IN CENA, em Coelho da Rocha, São João de Meriti, chega ao seu primeiro ano de vida celebrando aquilo que sempre moveu esse projeto: a arte feita por nós e para nós. A Baixada em cena. O nosso território no centro. De 13 a 17 de maio, o espaço abre as portas com uma programação inteira pensada pra fortalecer tudo que foi construído até aqui — com coragem, cuidado e muito suor. Serão cinco dias de encontros, shows, rodas de conversa, exposições, festa, poesia e cinema. Tudo gratuito, feito com carinho e cheio de oportunidades para quem vive de arte e acredita que resistir também é criar. Pra além da celebração, o momento também é de renovação: estão abertas as inscrições para duas noites especiais da programação musical — a MPB: Música Popular da Baixada , na quinta (16/05), e o BXDELAS , na sexta (17/05), com line-up 100% feminino. Ambas voltadas para artistas da região que desejam mostrar seu som, sua voz e sua potência. “ A ideia é celebrar esse um ano mostrando exatamente o que a gente tem feito: dar voz, visibilidade e dignidade artística pra quem constrói a Baixada todos os dias com arte. Estamos aqui pra que Meriti e toda a Baixada se enxerguem como potência cultural ”, diz Jéz , idealizador do espaço e curador da programação. Jéz é cria da Vila Ruth, o multiartista e produtor viu no BXD IN CENA não só um projeto, mas uma resposta ao apagamento histórico da arte preta, periférica, indígena, LGBTQIAPN+ e popular da nossa região. Em apenas um ano, o espaço já recebeu dezenas de artistas, realizou eventos diversos e se tornou ponto de encontro entre quem faz arte e quem acredita que a cultura da baixada precisa ser vista, valorizada e cuidada. A programação de aniversário começa na terça-feira (13/05) com bolo de aniversário e cinema, marcando também o nascimento do Cineclube Dona Celestina . E segue com discotecagem, exposições, rodas de conversa e muita música. 📣 Inscreva-se! Artistas interessados em participar da MPB – Música Popular da Baixada  ou do BXDELAS  podem se inscrever através do link na bio do Instagram @bxdincena . As vagas são limitadas. 🌟 PROGRAMAÇÃO – 1 ANO DO ESPAÇO CULTURAL BXD IN CENA Terça-feira – 13/05 | 19h às 22h 🎂 Aniversário do BXD IN CENA + “Jéz Convida” (com bolo!) 🎬 Inauguração do Cineclube Dona Celestina  (sessão de curta + bate-papo) Quarta-feira – 14/05 | 20h às 00h 🎧  Noite de discotecagem com DJ Gazza e convidados Quinta-feira – 15/05 | 19h30 às 22h30 🎙️ MPB – Música Popular da Baixada (até 4 artistas autorais)🎵 Samba, soul, R&B, acústico e outras sonoridades da nossa música popular Sexta-feira – 16/05 | 20h às 02h 🎬 Exibição do audiovisual "Memória, história é filme, não é foto"  (20h)💜  BXDELAS  – DJs, pocket shows e poesia com mulheres da Baixada👑 Curadoria: Lohanna Alves Sábado – 17/05 | 14h às 00h 🎨 Exposição de lambe-lambe (14h )🗣️ Roda de conversa “Arte de Rua & Memória” (16h) 🎉 Encerramento da Semana de Celebração (a partir das 19h) 📍 Sobre o Espaço Cultural BXD IN CENA Mais que um espaço, o BXD IN CENA é território vivo. Um ponto de cultura criado por e para artistas da Baixada Fluminense, idealizado por Jéz — cantor, compositor e multiartista de São João de Meriti. Em seu primeiro ano, o espaço se tornou referência em cultura periférica, promovendo oficinas, mostras, saraus, cineclubes e festas que colocam a Baixada no centro do mapa da arte independente. 📌 Pega a visão: Evento:  Semana de Celebração – 1 Ano do Espaço Cultural BXD IN CENA Data:  De 13 a 17 de maio de 2025 Local:  Rua Prata, 35 – Coelho da Rocha, São João de Meriti – RJ Instagram:   @bxdincena Inscrições: Link do formulário

  • Que bom que cê' tá' revoltado, mano!

    Como o baixadense se enxerga? - pt. 2 Foto: @fabioribeirofotografia. A pergunta feita nessa sessão de “estudos” (não quero ser prepotente, mas não deixam de ser estudos, né?) norteia cada segundo da minha existência desde que me entendi como parte do organismo vivo que é a Baixada Fluminense. Questionar e refletir como nos enxergamos – em nós mesmos e em nossos semelhantes – é mais uma forma de pensarmos coletivamente em como reafirmar e valorizar nossos espaços e nosso território. Como bom apreciador de arte, vez ou outra preciso me escorar nalguma obra artística pra suportar a correria dos dias, e como bom apreciador de música baixadense, por MUITAS dessas vezes são artistas baixadenses que ocupam meus fones de ouvido pra me dar forças, alguns que já passaram pelo Ideias de Hermes Podcast, outrxs que ainda não. Mas sempre pessoas com as quais eu já troquei alguma ideia sobre o que a arte e a cultura pode fazer pelo nosso território – presente e futuro. Já falei isso com ele quinhentas vezes, de tempos em tempos o álbum que toca on repeat nas minhs playlists é o álbum “ O Dever Me Chama ”, do Dudu de Morro Agudo , datado de 2018. E pra esse texto eu escolhi a faixa “ João ”. Foto: Reprodução: YouTube. “Certo dia o João me falou que a vida não é dedilhada Não é conto de fada. A vida é quebrada mano, quebrada. Então o João me disse que só tem duas certezas na vida: Uma é que ele vai morrer, E a outra que ele vai morrer pobre. Porra, João... Por quê que cê não se revolta, João?” Todo mundo tem aquele amigo que se vê tão cansado da rotina que, apesar de se incomodar com o que acontece, tal qual João dizendo que a vida é quebrada (não só a “quebrada” como ambiente, mas como algo que não está funcionando da forma mais eficiente possível), não se vê capaz de mudar alguma coisa. Isso fica nítido ao identificarmos que ele diz que “a vida” de um modo geral, não “sua” vida, é/está quebrada. Enquanto, na última análise, o interlocutor se colocava como quem sabe o que é e a potência que tem, nessa o amigo se mostra impotente por não saber de sua potência. Porém isso muda, graças ao eu lírico que dá o famoso “papo de amigo”: “Por que que cê’ não se revolta quando olha em volta? Por que que isso não te revolta? Sabendo que os caras tão ricos e mais perto de rico Que eu fico é pra fazer escolta Eu sei que não dá pra sorrir , Não dá pra fingir A meta é ser fora da lei você vai ser bem mais feliz se fizer o que eu fiz e um dia souber o que eu sei . ” A potência que parece faltar, num primeiro momento, na percepção de João é posta em xeque com uma rajada de rimas, que pra quem ouve a obra, percebe que a entonação usada é a de quem passa muita informação de uma vez só. Há uma urgência, por parte do eu lírico, pra que seu amigo se desperte e se revolte – não necessariamente de forma pacífica – contra o sistema que o oprime e que deixa a vida “quebrada”. “ A vida vai ser bem melhor, vai ser bem maior Você vai sentir o amor É assim que vive, livre Não prive, motive alegria, por favor Do jeito que tá vai ficar, isso não vai mudar Se você não sair do lugar O povo trabalha igual louco, passando sufoco Rezando pra se aposentar” A revolta traz a esperança da mudança, não porque só sabemos viver em conflito, mas porque já entendemos que a apatia e se entregar à situação não “conserta” a vida “quebrada”. Há um chamamento não para o conflito, a briga, a confusão; mas para o movimento, a saída da inércia, a tomada de atitude acerca do problema. É importante apontar essa parte, porque direto a gente tem nosso discurso sendo distorcido como um discurso escandaloso e violento, quando na realidade não é isso o que acontece: o que existem são discursos de reação à(s) violência(s) sofrida(s) pelo povo periférico (e, nesse caso, baixadense), que pode ou não se tornar um discurso violento caso a argumentação não seja suficiente pra combatê-la(s). “Há!! Faça-me o favor, Tanto caô que vem do “Senhor” Quem que botou ele lá? Por que ele tá lá? É hora do povo compor Que seja no voto ou na bala, sim, Porque esse é o início do fim Cada um tá fazendo sua parte e agora o João acordou e acendeu o estopim. Que bom que cê’ tá revoltado, João! ” Foto: @gr_fotografo O questionamento é feito e respondido na mesma estrofe: se o “caô” vem do senhor, quem o colocou lá? O povo. Por que ele está lá? Para servir a esse povo. Então, nesse caso, é hora de o povo compor sua própria história. Trazemos para nossas mãos um poder que não deveria ter saído delas: o poder de escrever nossas próprias histórias e seguirmos, com o mínimo de conforto e dignidade, nossas trajetórias profissionais, acadêmicas e nosso convívio social. Conclusão “O início do fim” não parece ser o fim de tudo, e sim o fim do regime que nos intimida, nos explora, nos descarta e nos mata todos os dias. O estopim aceso por João pode ser sim entendido como algo material, mas parece mais coerente enxergar como a chave que precisava virar em seu entendimento sobre a vida e o que permite tomar o controle de seu próprio caminho. João acordou e acendeu o estopim. O que faremos, nós, então? Acompanhamos João em sua nova caminhada ou ficaremos como no início da obra, reclamando de como a vida é quebrada? Que a chama do estopim de João nos desperte pro movimento e nos dê foco para continuar no que precisamos todos os dias.

  • Prêmio BiC 2024: Confira os grandes vencedores das principais categorias

    A cerimônia celebrou os destaques culturais da Baixada Fluminense em um domingo (26/01) marcante no Espaço BiC. Sobre o Prêmio BiC O Prêmio BiC  é uma iniciativa do coletivo BXD IN CENA , criado para valorizar os profissionais da música e do audiovisual da Baixada Fluminense. A premiação celebra o trabalho árduo e o impacto cultural dos artistas e produtores da região, fortalecendo a identidade local e promovendo reconhecimento na cena cultural. A primeira edição aconteceu em 10 de dezembro de 2023 , marcando o início de um evento que se tornaria referência para a cultura baixadense. História e Etimologia O nome "BiC" surge da abreviação de BXD IN CENA , simbolizando o protagonismo cultural da Baixada. O prêmio foi criado para prestigiar artistas e fazedores de cultura, destacando trajetórias e obras que marcaram o ano. Processo de Indicação e Seleção A escolha dos indicados e vencedores ocorre em etapas: Indicação inicial : Formulários são enviados aos membros associados, que sugerem nomes para as categorias. Votação : Membros votantes selecionam os finalistas entre os mais indicados. Decisão final : Um júri técnico formado pelos administradores do BXD IN CENA escolhe os vencedores. Identidade visual : Criada pela designer Ananda Savitri, com colaboração de Vinivask e Gazza. Júri Técnico/Administração : Jéz, Higor Cabral, Josy Antunes, Vinivask, Saimon Henrique, Fijó, Malê, Caiçara, Gazza, Bea Domingos, Zacconi. Mestres de Cerimônia: Dorgô, Malê, Lohanna. Conheçam os vencedores as principais categorias do 2º Prêmio BiC 2024: ARTISTA REVELAÇÃO DINNEI MC   🏆 VINIVI VALEN KAN ISCARLETT INBUTE TONNY HYUNG VERÇOSA LUCAX FERNANDEX ADRIELLE VIEIRA SAMUÉU   ÁLBUM DO ANO RAP A.T.O.M.O – TEXTOSTERONA VOLUME 03 ONÃ – QUEM SEMPRE TEVE TUDO NUNCA VAI ENTENDER AYSHA CATT – DEIXA EU ME EXPRESSAR KAN – TYPE BEAT KAN HASHI – É O RITMO ONNI – FOGO SERPENTINO (DO ÚLTIMO NADA AO NOVO NINGUÉM)  🏆 SARDA MC – NÚMEROS EMIT’S – FORA DA CURVA DIPAUL4 – FACTUAL RJ (DELUXE) SPIKE MC – 021 RAP DE CARTEIRA ASSINADA     ÁLBUM DESTAQUE BAIXADA NVN – MONTANAWAV. CAPELLONI – REBAIXADA EMIPÊ - LINHA 1 – PROCESSOS XAMY – MAROLENTA DA BAIXADA NEVS – A FESTA NUNCA ACABA BISTRÔ – BISTRÔ RICO MESQUITA – O PRESIDENTE BAIXADENSE 🏆 LIL CXSMX – SINESTÉSICO DELUXE EDITION WILD – VICIANTE VALEN – PARAÍSO DA NINFETA, VOL 1     ÁLBUM DO ANO KBRUM – PURO SUCO D$ LUQI – O EMBLEMA DO INFINITO CAXTRINHO – QUEDA LIVRE 🏆 KING SAINTS – SE EU FOSSE UMA GAROTA BRANCA THAMI – LABIRINTO ORUÃ – PASSE     EP DO ANO XARI – CORDAS XT, DIPAUL4, G2OIS – AUSTIN NOT FLORIDA INBUTE – HEFESTO 🏆 ARTELAS – LAPSO I DERXAN – O LADO BOM DO HOMEM MAU ALMA SOLAR – REQUICIOS DE UMA ERA HEI7OR – MEMÓRIAS ZOOM – CADA SEGUNDO É UMA NOVA CHANCE OLY – VOZ OCULTA VINIVI – RETRO VERSO FESANT – SOM DE FAVELA JXAO – ALÉM DO QUE SE VÊ MC TAYA – HISTERIA AGRESSIVA 100% NEURÓTICA   MÚSICA DO ANO CADÊ? - XARI, ROJÃO BLOCO – RICO MESQUITA, PASSARINHO SOCO NA COSTELA – VALEN, EGDG, LARINHX CRISTO REDENTOR – HASHI, PEDRO APOEMA TEM BARATA VOADORA QUE SE ACHA BORBOLETA - NATO AMÉM – JAZZAOQUADRADO BAILE DO AMANHÃ – REMIX – GZLZ, MAUI, ANTCONSTANTINO ESCOLA DA VIDA – SPIKE MC SE EU FOSSE UMA GAROTA BRANCA – KING SAINTS 🏆 CRIA DE BEL – CAXTRINHO ME DESCULPA VEIGH – AFRODITEBXD REAL GRANDEZA – ORUÃ     ARTISTA DO ANO KING SAINTS MAUI AFRODITE BXD 🏆 CAXTRINHO SHURY SPIKE MC MALU KALEBE     BEATMAKER/PRODUTOR MUSICAL DIONIZIO DOSANJO NINJA 🏆 SABAT LARISSANAOTA BUZU PBLBEATZ JULIE DANTAS PRODBYMKS     COLETIVO BXD DO ANO CASA UIVO BAIXADA CINE REDE BAIXADA LITERARIA GOMEIA GALPÃO CRIATIVO ONÃ CULTURAL 🏆 ENRAIZADOS PROJETO PROF. FÁBIO CASTELANO INST. MIRINDIBA PEDALA QUEIMADOS GRUPO CÓDIGO INST. CULTURAL CERNE BLACKRAP BXDLAMBE     DJ DO ANO JOAZZ 🏆   JACQUELONE SUAVE PRETA ANTCONSTATINO GABIVIC AKA IMPERATRIZ SOPPA HIGH TUCO DJ JAVA TERROBIXA EFFY ELLEN KELLEN CL FEZ O BEAT     ARTISTA PROMESSA  MARREKIN AYSHA CATT 🏆 MTZYN JOYBXD MATHEUZÃO YXNG BINO XARD BXD CRIOULA AKATZE45S DMENEZES R. DIOP ACLOR   COMPOSIÇÃO DO ANO HIPÓTESE – JOÃO PASSERI VEM CÁ – KALEBE INTACTO – ONNI, KIB7 BAÍN DE CACHOEIRA – CAPELLONI, ARYELLE MANDA E DESMANDA – LETTIE CAMINHANDO EM RÉ – THAMI 🏆 MALANDRAGEM – R.DIOP MAGNÓLIA – Á.T.O.M.O VOZ OCULTA – OLY   BANDA/ARTISTA ROCK DO ANO ORUÃ GUVRIM VENTILADOR DE TETO MC TAYA 🏆 MARABÔ T-REMOTTO HABITANTES DE LUGAR NENHUM NORTE CARTEL GLADSTONE ARTELAS   COLABORAÇÃO DO ANO (FEAT)   CADELA – KINGS SAINTS, LEVINSK, BOOMBEAT, AFRODITE BXD ALFORRIA – ONÃ, BIA FERREIRA, DINHO TARDISOL – JXAO, NATO, SABAT INTENSÃO – AFRODITE BXD, MAUI, TALEKO 🏆 1001 ROTEIROS – BLACK, IZRRA ME PAGA – RICO MESQUITA, YXNG BINO, JAMALL DO BECO, NINJA O QUE CÊ FEZ? DERXAN, MALU ORIGINAL SOSSEGO – NEVES, TARCIS, CRIS, ERICBEATS, BAO PRESENTE – LETTIE, CLARA RIBEIRO FITA CREPE – A.T.O.M.O, CAYUMA BRANKKKOS – CAXTRINHO, NEGRO LEO   MC BATALHA DE RIMA JOVEM RD RD.X SEREIA BXD BRAGA BXD THUG L WL BXD SILENT LH BXD 🏆 FILME DO ANO O MERCADOR DO EFÊMERO, Direção: Otávio Fontes ORÚN, O MUNDO DOS ORIXÁS, Direção: Thiago Xavier MESTIÇO, Direção: Sandro Garcia 🏆 BAIXADA SOB AFETOS, Direção: Thailane Mariotti ENTRE AS LINHAS: DA GEOGRAFIA E DO FUTEBOL, Direção: Guilherme Leopoldo PARA QUE LEMBREM DE MIM, Direção: Capelloni QUERO IR E VIR, Direção: Luiz Silfer  NO FRONT DELAS: MULHERES AMBULANTES E O COMÉRCIO DE RUA, Direção: Thayná de Andrade  VIDEOCLIPE DO ANO ORAÇÕES - DINNEI MC, Direção: Junior Passos CANTO DELA - ARYELLE, Direção: Aryelle e Capelloni CABOCLO - ORUÃ, Direção: Lê Almeida e Jorge Apolo DADIN - RARO FEAT. VND, Direção: Guilherme Leopoldo 🏆 TEM BARATA VOADORA QUE SE ACHA BORBOLETA - NATÖ, Direção: Emanuel Sant RESISTÊNCIA - TABITA INFINITO, Direção: Rebeca Coutinho e Tabita Infinito  VOU ME MOVIMENTAR - VIVI LAPROVITA, Direção: Luis Gomes, Thais Iroko e Viviane Laprovita REFLEXÕES QUE AINDA ME TIRAM O SONO - DUDU DE MORRO AGUDO, Direção Dudu de Morro Agudo  BLADE - KBRUM, ANTCONSTANTINO & TALEKO, Direção: Diogo Queiroz  SE EU FOSSE UMA GAROTA BRANCA - KING SAINTS, Direção: Léo Ferraz ME DESCULPA VEIGH - AFRODITE BXD, Direção: Jomboh Menções Honrosas : Cayuma, Atila Bee, Nath Finanças. Mais do que uma premiação, o Prêmio BiC  é um movimento que reafirma a potência cultural da Baixada Fluminense. A cada edição, o evento reafirma o compromisso com o fortalecimento da cultura local e a valorização de artistas que transformam vidas e inspiram novas gerações.

  • Bandido não, bon vivant.

    Como o baixadense se enxerga – pt. 7. A arte sempre foi um reflexo do contexto em que é produzida, e as disparidades entre as percepções de arte em ambientes revelam algumas desigualdades. Enquanto a arte no ambiente periférico surge como uma expressão visceral da realidade, um meio de resistência e sobrevivência, essa mesma arte só é considerada, de forma legítima, como arte quando sai desses ambientes – seja literalmente, seja em seu sentido inicial. Existe uma marginalização em relação à arte urbana, devido aos contextos apresentados e seu contraste, por exemplo, com a boemia de Vinícius e Tom, ícones indiscutíveis da música brasileira no imaginário popular. Quem decide o que é arte e o que não é? Até que ponto a noção de "arte legítima" alimenta desigualdades sociais que silenciam as vozes periféricas? Será que está sendo perpetuado um sistema que valoriza mais o lugar de onde a arte vem do que a mensagem que ela carrega? Para ajudar a responder a essa e a outras questões, vamos analisar trechos da música “ Riquelme ”, do artista meritiense R.Diop . Apesar da obra de Diop ser variada em objetos de pesquisa, escolho essa em específico dada a multiplicidade de significações que o letrista traz em sua composição. 10 da boca, Riquelme 10 da boca, Riquelme Girando grana sem porte na boca Peixe no bolso sem capotar barca Meus cria frente da boca Classe Zinedine, adesivo da França no pente Jacaré na roupa, disfarce do jaca Terço dividindo espaço com a corrente Puma Disc no porte O bala da vez, Didico em 2k2 no ataque Multiplicando bala Cristo castigou pedras na cruz dando pedras de crack Nessa primeira parte, além do jogo de palavras com o antigo camisa 10 do Boca Juniors, Juan Roman Riquelme, o letrista traz a quebra de expectativa logo em seguida, alegando que está confortável, mas sem o que a sociedade espera que ele esteja fazendo para conseguir esse conforto. O fato do terço dividir espaço com a corrente remete tanto ao contexto cristão que toma boa parte das vivências periféricas no Brasil, não abandonando sua fé, quanto ao estilo carregado pelo 10 da boca. Do meu pai herdei vícios e traumas Amor por maços e copos Meus heróis portavam rádio e não capa Se livravam dos problemas queimando na mala Porra eu não sou envolvido São relatos do que eu vejo Histórias sobre homens mortos, sobre cachorras e motos Minha cara fechada é ódio e não marra Butler (2020) sugere que o julgamento de pessoas não racializadas em direção à realidade de pessoas racializadas pode ser lida como “aquilo que foi selecionado, cultivado, regulado – de fato, policiado” (BUTLER, 2020, p. 3) 1 . O que o artista traz nesse trecho evoca uma resistência preconceituosa de entenderem que nem todo mundo na favela oferece perigo. Essa compreensão limitada ignora todos os níveis de escassez que atingem os ambientes periféricos, ignora as vivências das pessoas que ali estão. Ignora as dores, os traumas, os medos e os perigos que todo morador de ambiente periférico passa todos os dias. Visão Quanto maior for a prece maior a oferenda Tua ambição diz teu tamanho pro mundo A carga só gira enquanto tu sustenta Antes tu era o que come Hoje só vale o que fuma Menor na boca só pra tirar foto, MC’s cantando o que veem pela foto “ Cês não são porra nenhuma!” Nos primeiros versos após o refrão tocar novamente, é estabelecida uma relação entre fé, sacrifício e ambição. Se hoje pode ser seu último dia, você tem 24 horas para mudar essa realidade. O artista traz um pedaço cruel da vivência periférica, onde sobreviver passa por usar o que você tiver na hora que tiver, porque amanhã pode não ter. O amanhã pode não vir. Logo em seguida, introduz a principal contradição exposta pela letra, em minha opinião. Se antes, você era valorizado pelo que tem para repartir (ainda que não o fizesse), hoje somos valorizados pelo que temos para gastar. Quem gasta mais – independente de onde, como ou com o que – ganha status. Fácil falar do balão que nós sobe Foda é lembrar dos projéteis voando Visão além dos becos onde passo Cada esquina sangra a queda de um santo Playboy armado no filme é só arte Preto narrando o que vive é bandido As Fab deixam Beira mar no chinelo As patrícias da sul sobem e compram comigo O artista traz aqui as mesmas situações porém em ambientes diferentes. Dependendo do contexto – local, tempo, espaço e pessoas envolvidas – no qual o produto artístico for originário, haverão diferentes visões do que está acontecendo. É por isso que o povo da periferia consegue, com vassouras e canos, enganar um helicóptero de jornal sensacionalista de um dos maiores canais do estado do Rio de Janeiro. Eles realmente não fazem ideia do que rola aqui, e, quando tem algum movimento diferente, só pode ser bandidagem. 38 graus no asfalto quente Bucket e um 38 na cintura Bandido não, bon vivant Bandido não, bon vivant Kenner no pé, cyclone  de camurça Bandido não, bon vivant Bandido não, bon vivant Bala voa é a mesma que rasga blusa Bandido não, bon vivant  (fé) O letrista finaliza expondo tudo que, se em contexto diferente, talvez não seria lido como rebeldia, violência, crime ou ameaça de perigo. Reafirma diversas vezes ser bon vivant , não bandido. Vida mansa, boêmio, tal qual Vinícius, e digno de também ser chamado de referência da música brasileira através dos frutos de sua arte. Conclusão Bon Vivant  refere-se a uma pessoa que sabe aproveitar os prazeres da vida, sendo relacionado a um menino ou um homem que nunca é afetado pela melancolia, que só pensa em viver e passar o tempo de maneira agradável, que gosta de se divertir sem ofender ninguém 2 . Diop nos traz a cruel conclusão de que, na dinâmica de “trabalhe com o que você tem, pois amanhã pode não ter”, por vezes será necessário fugir das normas convencionais, na desculpa do “é só por hoje, pois vou mudar o meu amanhã”. Nessa perspectiva, o trabalho artístico e cultural feito na periferia precisa ser levado a sério, ser considerado legítimo. Este mesmo trabalho é o que serve para muitas pessoas redesenharem não só seus próprios futuros, mas também os futuros das pessoas próximas. Refs de cria 1 BUTLER, Judith. Em perigo/perigoso: racismo esquemático e paranoia branca. Educação e Pesquisa [online]. 2020, v. 46, e460100302. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1517-9702202046010030 . Acesso em: 08 ago. 2024. 2 BON Vivant. WIKIPÉDIA: a enciclopédia livre. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Bon_vivant . Acesso em: 08 ago. 2024.

  • Dedos que deslizam [texto em rega]

    Temos uma relação intensa com as telas. Gastamos por volta de nove horas olhando para a tela de um computador ou celular, é o que revela recente levantamento feito pela Eletronics Hub (2023). Boa parte desse tempo realizamos a mesma tarefa, deslizamos os dedos na tela e eventualmente damos alguns toques também. Entre uma deslizada e um toque, alguns códigos de computador estão sendo executados, não dá nem pra pensar nisso nos 15 segundos de cada stories que a gente passa pro lado. Esses códigos escrevem o que vai aparecer na nossa frente, e ele fica rodando infinitamente, mesmo quando seu aplicativo não está aberto no celular. Esses códigos tem um objetivo, te manter online e deslizando. Online e roteando. Para alguns especialistas a intenção é que você consuma cada vez mais conteúdo, dando visualização principalmente para os conteúdos patrocinados por empresas, as publis. Para outros especialistas, há um interesse em te deixar tão hipnotizado, a ponto de reprogramar a forma como você vê o mundo. Existem inúmeras análises acerca da intenção das redes sociais em te manter utilizando elas. Ainda sobre esses códigos, chamamos eles de Algoritmos, um nome guarda-chuva para o que rola em baixo dos panos dos aplicativos e sites que você acessa por aí na web, e principalmente nas redes sociais, esses algoritmos, ensinam os aplicativos a te mostrar o que você tem mais interesse em assistir. Independente de qual seja a intenção real dessas plataformas, o que é uma realidade é que o seu tempo vidrado nas telas, é um tempo que não volta mais. Considere que sua visualização vale dinheiro, porque existem empresas pagando criadores de conteúdo, para criarem conteúdo, pra você, isso mesmo, você no busão lotado de manhã ou no Ramal Gramacho voltando pra casa, a sua visualização paga o salário de muita gente. A sua simples deslizada, seu toque pro ladinho pra voltar e rever os stories que você passou correndo, tudo isso gera um rendimento pra alguém. Seja pro criador de conteúdo, pro programador daqueles algoritmos, e se você estiver no Twitter, vai tudo pro Elon Musk, mas principalmente, sua visualização alimenta bilionários. Esse tempo dedicado às redes e à internet de modo geral, é um tempo que muita das vezes não é lucrativo pra você. Minha querida internauta, talvez você se pergunte, mas qual é o problema? O problema é que, lembra que te falei que existem muitas análises sobre os códigos e os algoritmos, sobre as intenções e por que os algoritmos existem? Então, algumas delas, realizadas por pessoas e organizações bem importantes, relatam que as redes sociais estão causando impactos reais à nossa saúde mental, nossa saúde física e como temos chamado lá na InfoCria, nossa saúde comunitária, que é em poucas palavras, como você está se relacionando com a sua comunidade e as pessoas próximas a você. Vamos dar um destaque ao TikTok, que não revela o funcionamento de seus algoritmos, para os especialistas que tentam analisar e entender, o que o TikTok tem feito na mente de crianças e adolescentes mundo afora. A falta de informação sobre o funcionamento dessas tecnologias, nos deixa sem muito o que fazer para lidar de forma mais saudável com elas. O que conseguimos alcançar enquanto pessoas usuárias, é criar meios de usar as Redes com mais carinho com nossas cabeças. E esses meios estão disponíveis de graça, talvez até infelizmente, na internet. Muita gente tem tentado reinventar seus jeitos de estar online, pra repensar o tempo que se passa em cada coisa, o quanto cada rede social faz você dedicar mais ou menos horas, como ficar menos tempo mas ainda assim aproveitar do que o feed infinito pode te oferecer. A essas técnicas e jeitinhos, damos nomes diversos, e vou falar um pouco com vocês sobre a Internet Lentinha e o Data Detox. Essas 2 coisas, são bem parecidas, são parentes próximas que você precisa manter por perto. A internet lentinha, é o convite para que você use a internet devagar, como diz o nome, que foi uma tradução amigável minha ao termo em inglês, slow web, que seria algo como WEB LENTA/DEVAGAR. Nesse movimento da net lentinha, você pode seguir com o uso das redes sociais e aplicativos, desde que organize seu tempo nelas, que horas você começa a usar o Instagram? Será que pode começar um pouco mais tarde, e fechar o aplicativo de vez um pouco mais cedo? Isso já mudaria muita coisa na sua vida, acredite em mim! Mais sobre o movimento Internet Lentinha você encontra alguns textos contando sobre experiências práticas, clica aqui pra acessar. O Data Detox(zada) já tem uma pegada diferente, a proposta aqui é também você repensar seu uso das tecnologias, mas cuidar também de um outro bem valioso seu, seus dados pessoais. Você sabe o que é isso? Falando rápido sobre, tudo que você faz na internet, fica registrado em algum lugar, a hora que você clicou em algo, o tempo que você passou numa página, e até mesmo quantas vezes você ouviu a mesma música. Essas informações soltas, não servem de muita coisa, mas quando elas são vinculadas à você, é possível começar a entender o que você gosta de fazer, que horas você gosta de fazer e com quais ferramentas e aplicativos você costuma gastar mais do seu tempo. Isso são dados, pessoais e muitas vezes considerados sensíveis, principalmente quando indicam informações suas que provavelmente você não gostaria que todo mundo soubesse, ou pior, que as pessoas vendessem o que sabem de você por aí. Notícia ruim agora, muitas empresas vivem disso, de negociar os dados pessoas gerados em suas plataformas, sites, apps e jogos. E o Data Detox, é o movimento que procura preservar seus dados, te trazendo ferramentas para que você evite usar plataformas que fazem esse tipo de uso das suas informações pessoais. Tá tudo na internet, clica aqui que você pode conhecer melhor, tudo em português também, beleza? Se isso parece complicado pra você começar a fazer hoje, não se preocupe, a gente também não faz todo dia, algumas coisas são trabalhosas e demandam até conhecimento técnico. Só que muita coisa também é simples de ser feita, e você, que aprendeu a deslizar o dedo como ninguém, vai aprender rapidinho que eu tô ligado. A InfoCria se coloca à disposição para fortalecer sua vida online, vamos trocar uma ideia? reparou que tinha [texto em rega] lá no começo? é porque ainda estou no cultivo dessas palavras, ou seja, o texto pode mudar totalmente, vai acompanhando daí minhameu faixa.

  • "Estou entre o fim e o recomeço mais uma vez"

    (Se possível, leia o texto abaixo ouvindo a música.) Por que nunca estamos dispostos a falar sobre o fim? Sabe, o fim inevitável das coisas? Pense naquele bom café que você tomou em uma cidade pequena e estava quase acabando. Ou na sensação de estar dentro do trem sabendo o destino final. A chuva ficando fraca num dia de calor insuportável. Ou na última música do seu álbum preferido. Este texto nada mais é do que uma reflexão muito íntima da minha maneira de enxergar a vida. E por muito pouco eu não o terminei, porque - por coincidência ou não - ele foi escrito durante uma fase de mudanças extremas. Você irá entender aos poucos. É impossível separar a ideia de mudança do conceito de fim. Freud (1915) escreveu um texto sobre a transitoriedade enquanto caminhava no campo com um amigo. O amigo estava perturbado e não conseguia aproveitar a beleza ao redor, pois pensar que toda aquela paisagem estava fadada à extinção o deixava arrasado. De repente, tudo parecia sem valor só porque um dia iria desaparecer. Freud oferecia uma perspectiva diferente de seu amigo, argumentando que a transitoriedade das coisas não diminui o seu valor, mas, ao contrário, aumenta. A beleza e a alegria que encontramos nas coisas transitórias são intensificadas justamente porque sabemos que elas são temporárias. Foto: https://www.instagram.com/p/ChSiGTYDbHn/?igsh=Y3FudGM1eWlmc3pm Quando disse que quase não terminei o texto é porque, quando ele começou a ser escrito (por volta de Março), eu ainda não tinha aceitado que a minha nova vida me custaria a minha vida antiga. Então, escrever um texto falando sobre enxergar beleza na finitude era uma grande mentira. E eu não insisti. Deixei que o tempo se encarregasse de me fazer enxergar que a minha zona de conforto e minha capacidade de ser amada e compreendida seriam totalmente transformadas e postas à prova. Até pouquíssimo tempo atrás eu não sabia quem seria no passeio com Freud. E talvez eu oscile para sempre entre a postura mais pessimista do amigo e a otimista de Freud. Talvez eu não precise nunca decidir entre uma ou outra. Mas, após experimentar alguns ‘fins’ nesses meses, eu aprendi coisas importantes. Existe SIM beleza em todo final, por mais ínfima que possa parecer. O café na cidade pequena acabou, mas te serviu bons momentos. Saber o destino final do trem te faz apreciar a paisagem de outro assento, de outra janela. Você pode encontrar outro álbum favorito, e outro, e outro. Pode escolher com quem dar o passeio e apreciar a paisagem. Pode escolher com quem aproveitar e desfrutar da beleza (findável). Obviamente não pensei num fim pra esse texto (pode dar uma risada agora, ok?) e eu nem quero que tenha. Quero que você, leitor, pense sobre a impermanência de tudo e sobre como todo fim leva a um começo (ou a outro fim). E nunca é igual. Eu desejo que você aproveite seu passeio e, quando for possível, não pense tanto assim no ‘peso’ de um ‘fim’. Nunca é de todo ruim. Enjoy your ride. Referências bibliográficas: FREUD, Sigmund. Sobre a Transitoriedade (1916 [1915]). IN: Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, vol. XIV. Rio de Janeiro: Imago, 1996

  • Flashes, hype... Eu só faço a pose.

    Como o baixadense se enxerga? - pt. 6 Sendo um artista independente baixadense, sei bem das dificuldades que se colocam entre nossa vida e o conforto – não digo sucesso porque não precisamos de fama, nem é isso que queremos: o objetivo sempre foi viver bem e só. No entanto, esse sucesso só vem de formas não muito relacionadas com a qualidade de nosso trabalho, nem mesmo com a quantidade de conteúdo que produzimos. Na maioria das vezes, as pessoas estiveram nos lugares certos, na hora certa e com as pessoas corretas. Não é segredo para ninguém que chegar em locais de destaque sem padrinhos ou madrinhas é infinitamente mais difícil.   Desse modo, o que acontece com a psiquê de um/a/e artista baixadense quando, apesar de tudo isso, apesar da qualidade enorme de seu trabalho, da coesão de sua vida artística, dos festivais e eventos nos quais foi chamade para se apresentar... Quando deixa de viver sua vida particular para viver sua arte e ainda assim as coisas não parecem mudar?   Para debater acerca destas (e outras) questões, vamos olhar hoje para a faixa “ Xanny ”, de 2021, do neoiguaçuano Zeca Passarinho . “ Xanny ” é uma corruptela de Xanax , um antidepressivo também conhecido como Alprazolam. Xanny , agora eu tô bem, yeah, yeah Xanny , white bitch quer Xann-yeah, yeah Gang , busco a minha gang Mano, eu só quero notas de cem, yeah, yeah   No refrão, o artista diz que agora sim está bem, porque conseguiu o tal do " Xanny ". Junto com este, a atenção de pessoas fora do círculo social do artista vem junto, o que parece acenar para um prestígio artístico maior para quem usa algum tipo de entorpecente. Este trecho deixa claro o objetivo após o uso da droga: dinheiro . Deixou de ser sobre fazer arte, deixou de ser sobre fazer sucesso: é sobre ter a grana. Este ideal continua a ser propagado pelo restante da faixa. Sujando o Jordan em ruas reais Estou focado apenas nos reais Nubank , cashback , Giros, streams lá no Spotify Mais uma vez, a busca incessante por reconhecimento de seu trabalho, que beira a obsessão, dá resultado não em projeção artística, mas sim em números: números na conta bancária, números nas redes sociais, números nas plataformas de streaming. Hoje, a arte independente está sujeita a algoritmos - que nunca trabalharão ao nosso lado -, de modo que quem quer de fato fazer arte se vê preso entre fazer como gostaria e fazer como o mercado gosta. "Viver de arte já foi sonho, hoje é só martírio" é trecho da faixa que inaugura esses estudos, e você pode ler o estudo aqui . Meu nome na boca de toda minha city Alguns mano na boca da minha city Você se emocionou com esse beat Ele saiu foi em 10 minutin Se tu quer um, joga o cash pra mim A polivalência do artista periférico é retratada aqui como mais uma busca pelos números. O compositor da faixa é também o beatmaker , que também é quem canta, que também é quem divulga, que também é quem marca seus shows e apresentações. Fica o questionamento: quando esse/a artista vai viver sua vida pessoal, se ele/a/u literalmente vive para a arte - que, por sua vez, não tem necessariamente a ver com ascensão financeira? Abandonado, eu me sinto sozinho Pra amenizar, to dropando esse lean Pro nego, a prata é a melhor companhia Eu to morando é na joalheria Flashes, hype ... Eu só faço a pose Mas por dentro, eu me sinto alone Xanny, make it go away… Please, please... Xanny make it go away… Na parte final da faixa, o artista demonstra como se sente quando não está sob o efeito da droga. O vislumbre do prestígio de certas pessoas, tratado no início da letra, agora não se faz mais presente ou, ao menos, não satisfaz mais. Não é suficiente. Não é pra isso o esforço. Fica nítido que o artista cai em si por um breve momento, mas logo em seguida se rende ao abuso da substância. Afinal, é muito frustrante se esforçar até o limite, dedicar tempo e energia, ser váries em um só pra, no final, dar de cara com a parede. Fica complicado continuar, dentro desse contexto, sem a alienação que a droga traz. Conclusão Trago esse texto como um choque de realidade acerca do que é fazer arte em ambiente periférico. Muites que só nos veem nos eventos acham que é fácil fazer o que fazemos, como se não tivéssemos que lidar com o peso da realidade no dia seguinte ou até mesmo dentro de um breve intervalo após o evento. Os mais velhos acreditam que somos do oba-oba, que somos baderneiros e que gostamos de criar caso, fazer arruaça. Ribeiro e Nascimento (2020) [1] alertam para a importância de um olhar mais cuidadoso acerca de questões sociais no contexto da dependência química / abuso de substâncias (lícitas ou não). A política em torno destas questões segue tendo um viés segregativo, de modo a limitar os acessos de tais pessoas à sociedade com o objetivo de ressociabilizá-las. Parece contraditório (e é), mas além disso segue as linhas de uma política de punição, não se preocupando em lidar com a questão e suas reverberações: O importante é esconder essas pessoas, não procurar ajudá-las. Xanny nos ajuda a entender o que se passa na cabeça de alguém que sofre com essa questão, e nos mostra que, apesar de qualquer pessoa estar suscetível a isso, sabemos bem quem mais passa por situações que nos derrubam nessa direção. [1]  RIBEIRO, Cynara Teixeira; NASCIMENTO, Zaeth Aguiar do. Racismo, Violência e a Questão Das Drogas No Brasil : Faces da Segregação. Revista Subjetividades ,  Fortaleza,  v. 20, n. spe2, p. 1-12, 2020. Disponível em < http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2359-07692020000500006&lng=pt&nrm=iso >. Acesso em 05  jul.  2024.  https://doi.org/10.5020/23590777.rs.v20iesp2.e8975 .

  • Às vezes me pergunto qual será o nome dos meus filhos.

    Às vezes me pergunto qual será o nome dos meus filhos, desses que a gente gostaria que fossem únicos e nos lembrassem todos os dias de onde tiramos doçura, forças e alegrias para guerrear, desses que me levam pro samba, pra linha de frente, que me fazem voltar para casa, olhar com ternura, fabular futuros e namorar nos bares. As vezes me pergunto qual será o nome dos meu filhos, assim no plural como quem quer ter a casa ampla e preparar banquetes nas refeições, às vezes me pergunto qual será o nome dos meus filhos, desses nomes que farão me lembrar dos dias e das noites que passei concebendo essa germinação, esse broto, essa face, esses olhos de lua, a maçã do rosto, a miudeza tão singela, choradeira, soluçar, meu erê. Quais serão as retomadas, os recuos, as limitações, os cheiros e gostos amargos que ficarão por debaixo da língua? Quais serão os desafios e glórias mesmo que planejadas não serão previstas, teremos de aprender improvisos, gambiarras, tecnologias e gestão, quais serão os sangues escorridos entre vida-morte-vida, os renasceres em claro na tentativa de cessar o seu choro, e as gargalhadas de uma boca banguela que saboreia o leite e morde o bico dos meus seios. Quais serão as fantasias que irão desmoronar  primeiro e me farão refazer as rotas, qual a encruza que me cerca e me dará caminho, meu menino, pés ligeiros sobre a terra, será que vamos morar no campo, acordar com as árvores, ou traremos a serra pra dentro de casa a fim de estarmos mais perto dos mestres? As vezes me pergunto qual será o nome dos meus filhos, e quais brincadeiras iremos inventar, como é que vai ser essa outra vida, como é que eles vão me acompanhar ao passo de como vou compreender o tempo deles, como é que o vento baterá no meu rosto, será que os banhos serão mais depressa, será que faremos travessias? Assim, meio ciganos, inquietos, com paixão pela inventividade, renasceres, meio em fuga e em rotas de liberdade. Seduz o corpo em movimento e em diferentes faces, daquilo que rasga o peito, as pernas, os braços, a vagina, nascimento como em lua cheia, vida, parindo o infinito sob olhares, silêncios acompanhados de suor e sussurros gritados. Um dia sentada na esquina de uma encruzilhada olhei nos olhos dela, ela mesma que usa saia rodada e gargalha na ponta da faca, ela me disse que eu seria feliz te recebendo, menino. Será que meus filhos irão desbravar o mundo como fiz na juventude? Mesmo cheia de medos acompanhados com coragem, sem saber ao certo se é isso mas caminhando nas margens e nos centros do desejo? Agora, enquanto permaneço nos braços de quem confluo paixão, compreendo o caminho, preparo a casa, organizo algumas miudezas para serem desorganizadas e sigo arando a terra. No mergulho, na musicalidade, neste seguir em grupo, aprendendo e tecendo a vida em comunidade. Um preparo, cuidado, semeadura. Nutrir, quais serão as músicas que farão parte dos meus dias e quais serão as dores que passarão pelo meu corpo, como será o enjoo de um corpo que carrega outro corpo e como é não ver mais os pés pela barriga estar grande? Quais serão os textos que escreverei a fim de encapsular memórias, e se eu chorarei em algumas noites por cansaço, terei a esperança de acordar sorrindo cheia de olheiras estando um tanto feliz por ter estar realizando essa história. Nas imensidões que me fazem fabular um futuro próximo, nas perspectivas do meu tempo, que é outro diante da Babilônia. Sentir os seios fartos,  qual será a próxima etapa? O que farei para não te mimar e te tecer passarinho em liberdade se esquecendo um pouco de mim? Assim traçado pela inventividade. E quando tudo deixar de ser história imaginada, te contarei baixinho mas em bom som como é que foi pra mim chegar até aqui. Notas: Esse texto foi parido por Thaysa Santos em lua crescente, e a música que ecoava em seus ouvidos era "Drão - Gilberto Gil." A imagem foi retirada do Pinterest.

  • Lê Almeida, a transfusão para além da Baixada Fluminense.

    Criado em Vilar dos Teles, São João de Meriti, Baixada Fluminense, encontrou em si mesmo a inspiração para acreditar e seguir seu próprio caminho, transformando a ideia utópica de fazer e viver de música em realidade. Lê Almeida, de Vilar dos Teles, São João de Meriti, na Baixada Fluminense, encontrou inspiração em si mesmo para acreditar e seguir seus próprios caminhos, transformando em realidade a utopia de fazer música e viver dela. Seu primeiro contato com a música ocorreu em casa, através dos discos de vinil de seu pai, com uma forte influência do Classic Rock. No início, definia seu som como Indie Rock de guitarra. O quintal de sua casa, que ele descreve como um lugar mágico, desempenhou um papel fundamental em sua formação artística. Foi ali que muitas de suas gravações e ensaios ocorreram, ajudando a moldar sua perspectiva de vida e arte. Em várias entrevistas, Lê Almeida mencionou como esse espaço foi crucial para o desenvolvimento de sua carreira, proporcionando um ambiente rico em percepções que alimentaram sua criatividade e visão artística. Transfusão Noise Records O selo musical de Lê Almeida nasceu de um sonho em 2004. Impulsionado por sua vontade de expandir e acreditar no que sempre desejou, Lê começou gravando suas próprias músicas e, posteriormente, as de amigos que encontrou ao longo de sua jornada. Ele afirma que a gravadora é especializada em rock de guitarra, barulhento e melódico. Em 2014, para comemorar os 10 anos do selo, foi lançado o LP "Gran Noise Family". Esse álbum comemorativo celebra uma década de dedicação à música, destacando a trajetória e a evolução do selo, que continua a ser um farol para artistas do rock alternativo. Ouça aqui Masterizado por João Casaes Produzido por Lê Almeida Oruã A banda de Lê Almeida começou no final de 2016, inicialmente com duas baterias, baixo e guitarra, gravando tudo em fita cassete. O que começou como um simples experimento rapidamente se transformou em uma banda com turnês internacionais. O primeiro álbum da banda, "Sem Benção/Sem Crença", foi lançado no Brasil em agosto de 2017 e na Flórida como um LP duplo. Em uma abordagem inovadora, esse disco também foi lançado no Spotify de maneira "normal" e ao contrário, com nomes, capas e títulos invertidos. Agora, em 2024, a banda está prestes a lançar seu quarto álbum, intitulado "PASSE". A nova turnê internacional começará na cidade de Boise, Idaho, e incluirá shows em diversas cidades fora do Brasil. Siga ORUÃ, banda de Lê Almeida no Instagram para descobrir uma nova visão sobre a Baixada Fluminense, que, apesar das conquistas internacionais, nunca deixou de lado suas raízes. Essa conexão profunda com suas origens transforma a identidade da banda, refletindo a essência de ser baixadense.

  • Na luta eu tenho é gosto!

    Como o baixadense se enxerga? - pt. 5 Tava demorando (pros meus padrões, ninguém me cobrou nada não) uma análise de uma das minas que tem feito muito pela arte e cultura baixadenses. Eufena, Laizz, Adrielle Vieira e mais um montão que tão aí, cada uma em seu estilo musical, registrando como é a vivência de um baixadense, mas nesse caso com um pequeno diferencial que às vezes pode tornar tudo um pouco mais complicado: ser mulher. Não quero reforçar aqui nenhum estereótipo machista quando digo ser "mais difícil"; a prova dessa afirmação está justamente em estarmos na QUINTA parte desse estudo e somente agora vou falar de uma música de UMA artista baixadense. É só olhar nas playlists do IDHBXD a quantidade de caras com som na pista e a quantidade de minas - o que não se traduz em número de minas no corre pra soltar uma música. A dinâmica é diferente, os produtores olham diferente pro trampo das minas, os "acordos" são "oferecidos" de maneiras diferentes,... enfim. Não preciso ser explícito, né mesmo? No entanto, apesar desse jogo de cartas marcadas, "as mina preta tão no poder", como bem disse Valen. Existe uma força e uma energia que somente uma mulher preta e periférica conhece, que beira a alquimia de transformar chumbo em ouro e é tão destrutiva quanto criativa: basta se colocar como obstáculo em sua frente. Falando dessa energia, vamos olhar pra letra da música "Canto Dela", de Aryelle, multiartista oriunda de Nilópolis. Um encontro, o ontem e o hoje A liberdade de ser quem é Vai sem medo Não tem segredo É como semente no chão Floriu O rosto da menina encantada No rastro do tempo, que é rei. Um pedaço de papel, Um sorriso que rasga o céu em cor A carta do tempo na brisa do vento ê ô, ecoou A música começa com um tom mais etéreo, somente com a voz de Aryelle, o que faz quem assiste ao videoclipe perder-se entre a história "cantada" e a história que o visual nos conta. Na letra, ela traz a presença do tempo, ou ainda de uma certa atemporalidade, mesmo que não saibamos ainda a que ela irá atribuir essa característica. O encontro do ontem e do hoje dá a ideia de algo ancestral, que não sabemos exatamente de onde ou como veio, mas que nos acompanha e nos envolve - tal qual a semente no chão, que floriu, ou a carta do tempo, que chega através da brisa do vento e ecoa. O eco, talvez o efeito mais conhecido de energia que vai e volta, é bastante presente no restante da música. Um rastro de pegada no chão A fé que ilumina é o clarão E a coroa da nega O sorriso é frouxo, Na luta eu tenho é gosto E muito fogo pra arder Ainda abordando a ancestralidade, um rastro de pegada no chão claramente remete ao que um dia foi uma pegada, que por sua vez foi um passo (e se eu quiser forçar um pouco, um dia esse passo também foi só uma ideia). Esse rastro é o que nos é disponível em diáspora, uma vez que a forma terrível como a cultura africana foi levada para fora de África tenha dado conta de limar a maioria dos registros acerca destes traços, muitos destes sendo registros vivos que exerciam a oralidade. Hoje, esse rastro é o que guia os passos da artista segundo a música. De modo similar, a fé se põe como clarão e coroa: clarão por ser aquilo que ilumina o trajeto, permitindo enxergar com mais nitidez os rastros que foram deixados, e coroa, por ser o que reafirma a majestade, que demanda reverência e exerce o poder. Esse poder é demandado na luta, da qual logo em seguida a artista diz ter gosto. A lógica se completa, uma vez que na luta é exercido o poder da majestade, e reforçada a fé. Ecoa, ah, ecoa O canto dela Afaste de ti todo mal, Afaste de ti todo mau olhado, Afaste de ti todo quebranto, Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Da minha visão (assumo total responsabilidade se estiver errado), o "canto dela" é justamente a energia da qual viemos falando desde o início da obra e que ainda não tinha sido devidamente nomeada. É o que ecoa, faz parte da fé que facilita o caminho e dá sentido a ele. É o que foi entoado muito lá atrás e que hoje não "retorna": é como se sempre estivesse aqui. Como se sempre fosse estar. O que ecoa e atinge Aryelle nem foi feito exclusivamente para ela, muito menos tem a pretensão de estagnar ao encontrar-se com ela, é fluido, atemporal e maior do que conseguimos enxergar. A artista entoa o que parece ser uma reza, uma cultura que nasce fora dos ambientes urbanos e a partir de processos de sincretismo religioso entre o cristianismo e as religiões de matriz africana, buscando orientação, proteção e cura. Eles vão dizer que você não pode Que você não deve ser sem se valer Mas a nossa história é outra pra quem tem tanta bagagem É difícil se entender Transbordou e queima como dendê Já raiou a liberdade que vem de você No último trecho antes dos refrões finais, Ary traz a sua parcela de contribuição para o canto que ecoa. Ela aborda pessoas - "eles" - que não só não acreditam na potência dessa energia como a invalidam, como se a "bagagem" não fosse suficiente, como se toda a história de superação e de resistência não fossem credenciais o bastante para entendermos a força e a persistência de uma mulher preta. Acontece que essa energia, esse canto é tão forte que transborda, queima, deixa marcas. É sagrado. Não existe como impedir esse fluxo de energia sem sair muito machucado no processo. Não se ponha entre uma mulher preta e seu objetivo porque, com força ou com graça, ela vai passar por cima e alcançar seu potencial. O canto ecoou, vai ecoar e ecoa, não importa o que se levante contra. Conclusão É uma conclusão que vai gerar mais debate (eu amo fazer isso). Existe uma questão, quase um paradoxo, no qual os padrões da sociedade não conseguem entrar no meio termo entre desconsiderar uma mulher enquanto perfeitamente capaz de viver sem um homem, e simplesmente jogar tudo em suas costas, confiando que sua potência, energia e resiliência façam com que as coisas atinjam o objetivo (geralmente a mulher não ganha os devidos créditos ao fazê-lo). Giffin[1] (2005) aborda que qualquer tentativa de estudar as relações de gênero precisa avançar além da descrição da evolução de "diferenças culturais" (entre mulheres, ou entre mulheres e homens) e da constatação abstrata da construção social das relações de gênero, para as investigar como elementos da política econômica atual, implicadas numa dinâmica global de dominação de nações e classes sociais e de mercantilização da vida (GIFFIN, 2005, p. 10). Entenda: não adianta nada você colocar todas as suas funcionárias mulheres para trabalharem no Dia das Mulheres e comemorar como se fosse uma conquista: você continua explorando a mão-de-obra feminina. Não adianta você dizer que "pras minas é só chegar e fazer amizade com os cria" pra se manter inteira na cena, se ao menor deslize você mesmo chama as moças de tudo quanto é nome sem nem saber da história direito enquanto passa a mão na cabeça dos seus "parças" por situações das quais você tem CERTEZA. Não adianta falar que "é só denunciar" se quando as mina vem - às vezes EM GRUPO - vocês negam voz. Não adianta de nada pagar de desconstruído falando sobre a liberdade sexual feminina, se você só chama as minas pra falar ou cantar put*ria, isso quando não é o famoso "quer participar do meu clipe não???" O canto que é identificado pelo rastro de pegada no chão, que é clarão e coroa, que transborda, que queima como dendê é muito mais do que isso. Capaz de muito mais. Não se rende a cenários de repressão e dá um jeito de encontrar seu caminho. É resistência mas com doçura, é movimento mas com estratégia, é sagrado quando fala do que é profano aos olhos da sociedade. E ecoa. Refs de cria: [1] GIFFIN, Karen. A inserção dos homens nos estudos de gênero: contribuições de um sujeito histórico. Ciência e Saúde Coletiva, v. 10, n. 1, p. 47-57, jan. 2005 [Acesso em: 20 mai. 2024]. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-81232005000100011.

  • Cada abraço garante o amanhã.

    Como o baixadense se enxerga? - pt. 4 Sempre me parece coerente lembrar do que isso aqui se trata (também pela frequência com a qual mando os textos pra cá) no começo dessas produções, porque no fundo é sobre mim. Mas, no fundo, é também sobre você, baixadense. Esses diálogos com o que a gente é, sente que é ou que pode ser, observando as letras das músicas dxs artistas que moram aqui só é possível porque estamos aqui, entende? Se nossos corpos não estivessem ocupando este território - fisicamente, não falo de nenhum lugar de militância neste momento -, certamente dariam resultados diferentes do que temos hoje. Talvez similares, mas ainda assim diferentes. Se as pessoas que encontramos pelo caminho não formassem o que chamamos de rede de apoio, ou se minimamente não nos acolhessem quando parece que tudo vai por água abaixo, já teríamos nos rendido a sermos somente ferramentas. E ferramentas não sonham, não almejam, não evoluem: só trabalham. E quebram, eventualmente. Dorgô e Aclor, com ajuda do I,go e com a galera da Nuvem ENT., conseguiram traduzir um pouco desse sentimento de comunidade na obra "Romance de Primavera", que foi lançada em setembro de 2023, com um audiovisual que busca mostrar um pedaço da cena cultural baixadense. Não à toa, foi indicada no Prêmio BXD IN CENA 2023, na categoria "Melhor Clipe". Chei' de coisa pra fazer, eu aqui pensando em você Tenho que acordar cedo, não consigo dormir Tento botar pra fora tudo o que eu sinto Sendo que [o que] eu sinto te faz existir Te faz resistir Te faz florescer Tudo que eu fiz pra chegar aqui E te ver nascer Tive que correr Disposta a sangrar Aclor canta que o que tem dentro de si faz quem ouve existir, resistir e florescer, mas não fala necessariamente que as três coisas acontecem simultaneamente em todas as pessoas. Desse modo, existem aquelxs que recebem sua arte como incentivo (florescer), outrxs que recebem como acolhimento (resistir), e ainda outrxs que recebem como identidade, pertencimento (existir). Eis que surge a correria no meio da poesia Tanta coisa que as vezes embola a mente Escreve letra no vagão, pede um beat pro irmão, O Dorgô traz a visão de quem, geralmente, é multitarefas: de dia, CLT ou trabalho informal; à noite, artista independente. É costume ouvirmos dos mais velhos que a vida não para pra gente fazer arte, e a obra é realista quanto a isso. Porém, ressalta que é a correria que surge no meio da poesia, não o contrário: A poesia, pela lógica, é maior. Não falo do presente pois ele é passageiro Não falo do dinheiro pois ele é passageiro Quando falo de mim, pergunto "qual o paradeiro?" Pois me sinto perdido aqui no Rio de Janeiro Existe um recurso linguístico (cujo nome me fugiu e em breve pesquisa não consegui achar, mas sugiro que procurem saber sobre) que busca a repetição das palavras em diferentes frases para, entre outros casos, enfatizar o que está sendo dito. Os dois primeiros versos nos lembram que tanto o presente quanto o dinheiro - coisas que costumeiramente são dadas pra nós como o mais precioso existente - são passageiros. Faz sentido buscar algo que seja tão frágil que possa escorrer por nossos dedos ao menor deslize? Óbvio que temos a questão da subsistência, mas a reflexão continua: Vale a pena ficar só com isso? Nos prendermos a isso? Não é assim que a gente se perde de quem é de verdade? O último verso antes do refrão demonstra a incerteza e insegurança de quem é, ao mesmo tempo, predador e presa: correndo atrás dos próprios sonhos mas tendo sobre si a cobrança da subsistência, da sobrevivência, do comer e se vestir etc. De janeiro a janeiro em roda cultural De março a março deságua um slam Toda primavera brota um sarau E cada abraço garante um amanhã Como sempre, o refrão nos traz a ideia central da obra. Nos dois primeiros versos, vemos que aquilo que existe, resiste e floresce tá aí o ano todo. Nesses primeiros cinco meses de 2024, por exemplo, já vimos muita coisa acontecer na cena cultural e artística baixadense: saraus, batalhas de rima, apresentações teatrais, lançamentos de gente nova, gente voltando a lançar coisa nova... enfim. Já nos dois versos seguintes do refrão, entendemos como e porque isso acontece. A comunidade acolhe e é acolhida, xs artistas são xs espectadores e vice-versa. Quem tá no "palco", ao olhar para baixo, vê rostos baixadenses e, por que não, se vê ali também, assim como quem vislumbra o palco e as apresentações vê rostos baixadenses - dx vocalista aos instrumentistas, à produção musical, à produção do evento. O fato de nos enxergarmos - mutuamente - nestes lugares conserva a continuidade do que estamos fazendo. Bom dia, mundo! (Bom dia, minha Baixada Fluminense!) Diretamente de um caderno que cabe no bolso Lembro do meu nascimento e do exato momento toda vez que esse beat eu ouço Eu sou o futebol, o fusca, Eu sou o pique-pega, Eu sou banho de sol, eu sou alvo de celas, Eu sou cada soldado que abaixou a arma na guerra, Eu sou o professor que ensina as verdades da terra Eu sou o pedreiro, a diarista, Eu sou o padeiro, a colunista Que não tá nos jornais, mas tá falando da favela Sou cada um que habita [n]ela Eu sou o que acontece dentro de cada viela Eu sou o beco, eu sou a quadra e os enquadro' que rola nela Eu sou do bem (sou) Eu sou do mal (sou) Isso é perspectiva, mas creiam que sou real Mais valioso que dólar, mais valioso que euro O sonho de jogar bola, realidade de um emprego Eu sou o pão, eu sou o café Sou cada guerreiro que às cinco tá de pé Eu sou a comunidade longe de religião Eu sou a felicidade em ter arroz e feijão Eu sou o camelô, eu sou a arte no vagão Eu sou o cobrador e o calote no busão Eu sou o que nós somo', cada dia em que se vive Eu me chamo poesia, e sou o porquê nós ainda vive' O trecho é bem longo, mas é recheado de identificações que, no fundo, dizem uma coisa só: o artista é o que acontece ao seu redor. Sem cotidiano, não haveria arte, e por muitas vezes esquecemos que o cotidiano nem sempre é bonito - na real, quase nunca é. É entupido de imprevistos, de sapos engolidos, de impaciência da gente para com outres e de outres para conosco. É mais aflição do que risada, é mais erro do que acerto, é mais bateção de cabeça do que sossego, infelizmente. Mas, no fim das contas: é por isso que estamos aqui. Pra bater cabeça, pra estar aflito, pra errar mais do que acertar, mas pra fazer isso em comunidade (me apoiando no clichê comum + unidade). Afinal é o abraço que garante o amanhã e ninguém se abraça por conta própria. Conclusão Como já falei aqui, pesquiso sobre gênero e masculinidades pelo CNPq pensando o corpo, e dessas reflexões saíram essa coluna. Dentro destes estudos, a filósofa Judith Butler (2018) diz que nos tempos de hoje, é como se estivesse sendo travada uma guerra contra a coletividade, ou a habilidade de nós, o povo, lutarmos não pelo outro, e sim ao lado do outro. Isso acarretaria nos moldarmos em nossa resistência para, além de acabar com esta guerra, nos certificarmos de que todes estarão sendo contemplados no caso de uma vitória nela (BUTLER, 2018, p. 78).[1] Romance de Primavera é, pessoalmente falando, um lembrete de que, apesar do fato de que se essa guerra terminasse hoje estaríamos condenades, estamos lutando o bom combate. A gente precisa mostrar esse lembrete pra mais gente. Seja aquelx que leva o abraço que garante o amanhã. Refs de cria: [1] BUTLER, Judith. Corpos em aliança e a política das ruas. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia / Judith Butler; tradução Fernanda Siqueira Miguens; revisão técnica Carla Rodrigues. – 1ª ed. – Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018, pp. 77-112.

  • "Somos o amor, o ódio, a guerra e a paz! Tranquilidade de tudo!"

    Como o baixadense se enxerga? – pt. 1 Agora que a gente já começou uma conversa maneira sobre identidade(s) baixadense(s), fica a pergunta: Como o povo baixadense se enxerga? Como estamos localizados dentro de nossas questões e até que ponto estamos certos em nossa visão sobre nós mesmos – não individualmente, mas do coletivo olhando para o coletivo? Pra falar com mais propriedade sobre esse assunto, decidi trazer algumas representações artísticas originárias da Baixada Fluminense, pra gente conseguir trazer pro debate como o baixadense não só se representa, mas como entende essa representação e os processos relacionados a ela. Stuart Hall[1] aborda que o tempo e o espaço são, entre outras coisas, coordenadas básicas de todos os sistemas de representação – escrita, pintura, desenho, fotografia etc. Pensando por esse lado, como nos representamos, coletiva ou individualmente, parte necessariamente de um ponto de vista temporal e espacial e traduz o que recebemos como estímulo do ambiente no qual estamos inseridos. Essa semana vamos olhar juntos pra música "Abismo", do Sarda MC com participação do R.Diop e do Dédalo MC, artistas originários de São João de Meriti. A track faz parte do álbum “Preto Sem Camisa”, de 2021. Os primeiros versos foram escritos e são cantados pelo R.Diop. “Acordei puto e com as neurose’ de uma noite em claro Bebi demais, fumei demais, até liguei pra Claro Escondendo tudo que eu sinto no fumê do carro Mas quando a morte me acompanha, o vidro sempre embaça” Logo de cara a gente bate de frente com um eu lírico que não se sente pronto, capaz ou seguro o suficiente pra expor o que sente, talvez, pelo contexto apresentado no álbum até aqui e que se seguirá pela faixa, por não querer demonstrar vulnerabilidade. São diversas – e um pouco óbvias – as questões que levam a esse comportamento, mas voltaremos nelas mais tarde. “Parei de tentar canetar umas canções de amor Antes de encher teu ego, eu quero a geladeira cheia” Existe sempre um conflito quando quem mora na periferia começa a fazer arte: atender às expectativas do mercado e fazer dinheiro, ou atender às minhas próprias expectativas em relação à minha arte? O “tentar canetar umas canções de amor” pressupõe tentativa seguida de fracasso, porém o verso seguinte justifica a questão de prioridade: antes de atender às suas expectativas, quero atender às minhas. “Querem minha cabeça e me dar uma coroa de flor Bem que meu santo avisou que ela né flor que se cheira” Culturalmente – e sem precisar de muita reflexão pra identificar a questão – não é esperado do povo preto e periférico lugar de destaque. Atingir este lugar de destaque exige, entre outras coisas, tempo para dedicar-se ao ramo/área de atuação, tempo este que nos é retirado devido às necessidades imediatas de nossas realidades. Isto posto, conseguimos entender quem é que quer a cabeça e coroa de flores do artista preto e periférico. “De onde eu venho, é crime, droga e umas pipa’ no alto De cara pro gol com a fome, vai pra boca e se consagra Dia de baile no pinote, rabiscando o asfalto VAR não funciona quando é preto caindo na área” Esse verso grifado não precisa de explicações. Pra quem não está familiarizado com o futebol, o VAR – sigla em inglês para Árbitro Assistente de Vídeo (Video Assistant Referee) – é o equipamento que verifica em vídeo as jogadas pra saber se aconteceu alguma infração ou não. A “penalidade máxima” no futebol é marcada, entre outras situações, quando algum jogador do time que ataca é derrubado intencionalmente dentro de sua área de ataque por algum jogador do time que está defendendo. Porém.... Este mecanismo de vigilância que deveria contribuir para a lisura e honestidade dos processos não funciona quando é um corpo preto a ser derrubado. Curioso, não? Aqui, uma parte do refrão, composto e cantado pelo Sarda: “A solução ‘é nós’ O problema ‘é nós’ ‘Nós é’ o controle de tudo Temo’ a força pra poder mudar e mover essa porra de mundo Somos o amor, o ódio, a guerra e a paz Tranquilidade de tudo Assumindo o risco, seguimos sem falha Monstro da Baixada, KTZ, vagabundo” Somos muita coisa. Somos paz pra quem nos proporciona paz. Oferecemos segurança a quem nos deixa seguros. Somos escândalo quando pensam que somos inferiores, pois fazemos questão de fazer ouvir nossas vozes e sentir nossas presenças. Somos o controle, pois a maior parte da mão de obra de toda a Região Metropolitana do Estado do Rio de Janeiro nos últimos 23 anos tem sido originária da Baixada Fluminense. Se a gente parar, o Rio inteiro para. Somos o amor e o ódio, a guerra e a paz. Mais um trecho, desta vez composto e cantado pelo Dédalo: “Noites escuras trazem luz, e eu nunca quis ser claro Me tromba à noite e tu verás que os meus olhos brilham Falar de crime eu tô cansado, essa porra é gatilho Viver de arte já foi sonho, hoje é só martírio” Não querer ser claro remete a ser contrário a um movimento de apagamento cultural, preservando, reconhecendo e ressaltando suas raízes de cor, com sua cultura, costumes e ideologias, apesar da tentativa de domínio que veio da Europa em direção ao nosso continente. Este genocídio cultural vivenciado nos ambientes periféricos tem sua proto-versão justamente na invasão dos povos europeus ao redor do mundo, processo conhecido carinhosamente como “Colonização”. Longe de ter o intuito de terminar alguma reflexão, acho essa faixa ótima pra debater como a gente – não só baixadense, mas ser humano – se entende de formas plurais, que num primeiro momento parecem ser contraditórias, mas que de uma forma ou de outra sempre foi uma forma genuína de representar o que somos: baixadenses. Se nos vemos como amor ou ódio, guerra ou paz; se nos entendemos como possíveis vítimas de violência à nossa identidade ou se não a vislumbramos por completo; seja como for: Estaremos atravessados por nosso território e o nosso agora. Cuidemos de nós. Coletivamente, eu digo. Pra que mais de nós possam fazer o que fazemos. [1] HALL, Stuart. Globalização. As identidades culturais na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.

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